O Que o filme, A Substância e Os Contos de Fada tem em comum?
- Isis C. Paranhos
- 11 de nov. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 14 de nov. de 2024
Um mergulho nas raízes da busca pela perfeição e o que a dualidade nos contos de fada modernos revela sobre a nossa própria psique. Assim como no filme A Substância, onde o embate entre juventude e velhice é retratado com clareza brutal, a busca pela perfeição e pela eterna juventude cria uma linha tênue entre o desejo de se tornar nossa 'melhor versão' e a loucura.

Alerta spoiler. Se você ainda não viu, talvez seja o momento de parar a leitura, ou apenas aceitar que irei contar sobre a narrativa para embasar meu interessante ponto de vista sobre a sátira, extremamente gráfica, da busca pela juventude eterna. Essa narrativa revela uma dualidade quase arquetípica: o velho e o jovem, a sombra e a luz, a bruxa e a princesa. Mas o que ocorre quando essa dualidade é explorada até o limite?
Na obra de Naomi Wolf, O Mito da Beleza, essa busca desenfreada pela perfeição física é descrita como uma nova forma de opressão, uma construção que aprisiona a psique feminina em padrões irreais e inatingíveis. Wolf argumenta que a pressão pela beleza serve como uma ferramenta para manter as mulheres em um estado constante de autoavaliação e insegurança, drenando sua energia psíquica e criativa. A juventude eterna, então, torna-se uma prisão, uma máscara rígida que sufoca o processo natural de amadurecimento e autoconhecimento.
Os contos de fada originais, especialmente os escritos pelos Irmãos Grimm, não foram feitos para domesticar a psique feminina, mas sim para explorá-la em toda sua complexidade. Nas histórias originais, as figuras femininas — bruxas, megeras, princesas — representam aspectos profundos da psique, muito além do superficial binário de 'boa ou má'. Como Jung diria,
'A visão do mundo dos contos de fada originais é uma viagem ao inconsciente',
onde o ego (o “eu consciente”) precisa confrontar suas sombras e integrações.
Nos contos de fada da Disney, essa nuance é perdida. A mulher se torna uma criatura fragmentada, reduzida a arquétipos previsíveis: a princesa pura e submissa ou a bruxa invejosa e velha. A dualidade que é essencial para o equilíbrio interno desaparece, deixando apenas um ideal inalcançável que reforça a insegurança feminina.
Clarissa Pinkola Estés, em Mulheres que Correm com os Lobos, ressalta a importância de honrarmos a mulher selvagem, aquela que abraça todas as partes de si mesma — luz e sombra. Clarissa nos lembra que 'quando perdemos a conexão com nossa natureza instintiva, perdemos o controle de nossas próprias vidas'. A dualidade que vemos em A Substância, onde uma versão rejuvenescida tenta erradicar a outra, é uma metáfora para o que ocorre dentro de muitas mulheres que internalizaram o ideal da perfeição. Ao sufocar sua 'megera', elas sufocam a própria intuição, a própria voz interior que clama por liberdade. E que carrega todo o aprendizado e experiência que angariou com a vida.

A sombra, representada pela 'bruxa' ou pela 'megera', não é um inimigo a ser destruído, mas uma parte essencial da psique que traz sabedoria e equilíbrio. Sem ela, nos tornamos apenas versões rasas de nós mesmas, meros reflexos de um ideal que não nos pertence. Ingênuas e facilmente manipuláveis.
Assim, como em A Substância, a tentativa de viver eternamente como 'a princesa' revela-se uma ilusão perigosa. A repressão de nossa própria complexidade resulta, paradoxalmente, em uma espécie de fragmentação interna, onde o ego toma o controle e nos distancia da totalidade de nossa essência. Quebrar esse ciclo significa aprender a aceitar, ou como diz Clarissa, 'a correr com os lobos', recuperando nosso instinto e a plenitude que vem da aceitação de todas as partes do nosso ser. O Que A Substância e Os Contos de Fada Não Contam Sobre a Juventude Eterna é que o perigo de abrir mão da sua vilã interna é continuar a ser facilmente manipulada pelas expectativas ou ambições alheias onde você não passa de um mero objeto ou meio que justifique um fim para o outro.

E você, já assistiu A Substância? O que achou dessa releitura moderna dos contos de fada? Se ainda não viu, ficou com vontade de conferir depois dessa perspectiva? Deixe nos comentários!
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